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O luto é uma experiência universal, dolorosa e profundamente transformadora, que todos nós acabaremos por enfrentar em algum momento de nossas vidas.

Como psicanalista e psicóloga, tenho me dedicado a compreender e auxiliar pessoas nesse processo tão complexo e doloroso. Neste post, falarei sobre os conceitos fundamentais da teoria freudiana sobre o luto, bem como as fases descritas pela psiquiatra Elisabeth Kübler-Ross em seu modelo do processo de luto.

Além disso, falarei sobre as implicações desses conhecimentos na prática clínica e na vida daqueles que estão enfrentando a perda de um ente querido.

Visão Psicanalítica sobre o Luto

Na visão freudiana sobre o luto Sigmund Freud, o pai da psicanálise, abordou o tema do luto em seu ensaio “Luto e Melancolia” (1917). Neste trabalho, Freud define o luto como a reação à perda de um objeto amado, seja uma pessoa, um ideal ou uma abstração, enfatizando que o luto é um processo natural e necessário, que envolve um trabalho psíquico de desligamento da libido investida no objeto perdido.

Freud descreve o trabalho do luto como um processo gradual e doloroso, no qual a pessoa enlutada deve confrontar a realidade da perda, e progressivamente retirar a energia emocional (libido) que havia investido no objeto amado.

Esse processo requer tempo e energia psíquica, pois cada lembrança e expectativa relacionada ao objeto perdido deve ser retomada, para que a libido possa ser desligada e, eventualmente, reinvestida em novos objetos.

Fases do Luto

As cinco fases do luto segundo a psiquiatra Elisabeth Kübler-Ross Elisabeth Kübler-Ross, envolve um modelo que descreve 5 fases mais comuns no processo de luto em seu livro “Sobre a Morte e o Morrer” (1969).

Embora esse modelo proposto por essa autora tenha sido inicialmente desenvolvido para compreender o processo de pacientes terminais, ele tem sido aplicado também para descrever a experiência de pessoas que estão enfrentando a perda de um ente querido.

É importante ressaltar que essas fases não ocorrem necessariamente em uma ordem linear e que nem todos vivenciam todas as fases da mesma maneira.

Negação e isolamento:

A primeira reação diante da perda pode ser a negação, uma recusa em aceitar a realidade da perda. O enlutado pode sentir-se atordoado, entorpecido emocionalmente e ter dificuldade em assimilar a notícia. Essa fase também pode ser marcada por um isolamento social, como uma tentativa de evitar o confronto com a realidade dolorosa.

Raiva:

À medida que a realidade da perda começa a ser assimilada, o enlutado pode vivenciar intensa raiva e ressentimento. Essa raiva pode ser direcionada a diversas fontes, como a pessoa falecida, a equipe médica, Deus ou o próprio enlutado. É comum que surjam questionamentos como “Por que isso aconteceu comigo?” ou “Como ele/ela pôde me abandonar?”.

Barganha:

Nesta fase, o enlutado pode tentar negociar com uma força superior, com o destino ou consigo mesmo, na tentativa de reverter a perda ou adiar o confronto com a realidade. Podem surgir pensamentos como “Se eu fizer isso, talvez ele/ela volte” ou “Se eu tivesse feito algo diferente, isso não teria acontecido”.

Depressão:

Quando a realidade da perda se torna inegável, o enlutado pode vivenciar uma profunda tristeza e desesperança. Essa fase é marcada por sentimentos de vazio, desamparo e apatia. O enlutado pode se afastar de atividades que antes lhe davam prazer e ter dificuldade em encontrar sentido na vida sem a presença do ente querido.

Aceitação:

Gradualmente, o enlutado começa a aceitar a realidade da perda e a se adaptar à vida sem a presença física do ente querido. Essa fase é caracterizada por uma retomada do interesse pela vida, por uma maior serenidade emocional e pela capacidade de lembrar do falecido com carinho, sem ser dominado pela dor intensa.

Como é o processo de Luto

É importante dizer que o processo de luto é uma experiência pessoal e única para cada pessoa e que as fases propostas por Kübler-Ross não devem ser entendidas como uma sequência rígida. Alguns enlutados podem vivenciar apenas algumas dessas fases, enquanto outros podem transitar entre elas de forma não linear. Além disso, a duração de cada fase pode variar significativamente de pessoa para pessoa.

Luto patológico e intervenção psicanalítica

Embora o luto seja um processo normal e necessário diante de uma perda, em alguns casos pode assumir um caráter patológico, configurando o que chamamos de luto complicado ou luto patológico.

Nesses casos, o enlutado pode apresentar sintomas intensos e persistentes, como tristeza profunda, culpa excessiva, ideação suicida, isolamento social e dificuldade em retomar as atividades cotidianas, mesmo após um período considerável desde a perda.

A intervenção psicanalítica pode ser de grande valor tanto para indivíduos que estão vivenciando um processo de luto normal quanto para aqueles que apresentam um luto complicado. No setting terapêutico, o analista oferece um espaço seguro e acolhedor para que o enlutado possa expressar seus sentimentos, explorar suas memórias e associações relacionadas ao objeto perdido e, gradualmente, elaborar a perda.

Através da relação transferencial, o analista auxilia o enlutado a confrontar a realidade da perda, a ressignificar sua relação com o objeto perdido e a lidar com os sentimentos ambivalentes que possam emergir durante o processo. A escuta empática e a interpretação dos conteúdos inconscientes favorecem a elaboração do luto e a retomada do investimento libidinal em novos objetos e atividades.

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Contribuições da psicanálise

Além disso, a psicanálise pode contribuir para a prevenção de complicações no processo de luto, ao oferecer um espaço para a expressão e elaboração das emoções desde os momentos iniciais da perda. O suporte terapêutico pode auxiliar o enlutado a desenvolver recursos internos para lidar com a dor e a construir um novo sentido para a vida após a perda.

Considerações sobre conflitos mundiais, pandemia, catástrofes naturais e o luto

No contexto atual, marcado por questões tão dolorosas, como as enchentes do Rio Grande do Sul, guerras e até mesmo COVID-19 que vivemos há pouco tempo, o tema do luto adquire uma relevância ainda maior.

Nesses cenários, a intervenção psicanalítica pode desempenhar um papel fundamental no acolhimento e suporte aos enlutados. Em meus atendimentos online, procuro oferecer um espaço para a expressão e elaboração das emoções relacionadas à perda, auxiliando o enlutado a encontrar formas criativas de homenagear e se despedir do ente querido, mesmo diante das limitações impostas pela pandemia.

Nesse sentido, a psicanálise pode contribuir para a compreensão e o manejo das repercussões emocionais que surgem em meio a essas adversidades da vida, como o medo, a ansiedade e a sensação de desamparo, que podem intensificar o sofrimento do enlutado.

O trabalho terapêutico pode auxiliar na construção de estratégias de enfrentamento e na promoção da resiliência diante desse contexto desafiador.

Em Conclusão

O luto é uma experiência dolorosa e difícil, que mobiliza os nossos recursos emocionais e nos confronta diante com a finitude da vida.

A teoria freudiana e o modelo das cinco fases do luto proposto por Elisabeth Kübler-Ross oferecem uma compreensão rica e abrangente sobre esse processo, enfatizando tanto o trabalho psíquico de desligamento da libido quanto as reações emocionais comuns diante da perda.

Como psicanalista, tenho testemunhado a coragem e a resiliência de pessoas que, mesmo diante da dor avassaladora da perda, encontram formas de ressignificar suas experiências e de construir um novo sentido para a vida.

A intervenção psicanalítica pode ser um recurso muito benéfico nesse processo, oferecendo um espaço de acolhimento, escuta e elaboração das emoções relacionadas ao luto.

Se você está enfrentando a perda de um ente querido, seja recente ou antiga, não hesite em buscar ajuda.

A psicoterapia pode oferecer o suporte necessário para que você possa vivenciar seu processo de luto de forma saudável e encontrar caminhos para a superação da dor. Lembre-se de que não está sozinho e de que há sempre esperança.

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